A CELERIDADE EM CONTRAPOSIÇÃO A MELHOR CONTRATAÇÃO NA LICITAÇÃO
A obtenção de proposta mais vantajosa através de um procedimento que estabeleça iguais condições de participação aos proponentes, com critérios objetivos de julgamento, não é inquietação recente. Conta-se que na Idade Média, os Estados da Europa usavam o sistema “vela a pregão”, onde os interessados em contratar com a Administração faziam suas ofertas durante o arder de uma vela. Quando do apagar desta, era selecionada a proposta do licitante que ofereceu o melhor preço.
No Brasil a preocupação também é antiga, iniciando sua regulamentação pelo Código de Contabilidade Pública da União e seu Regulamento em 1922; 45 anos mais tarde, as normas eram ditadas pelos artigos 125 a 144 do Decreto-lei nº. 200/67; em 1986, nova regulamentação instituída pelo Decreto-lei nº.2.300/86; por fim, a criação da Lei nº. 8.666/93 regulamenta toda a forma de contratação junto a Administração Pública, em consonância com o inciso XXI do artigo 37 da Constituição Federal, revoga todas as disposições anteriores. No cenário nacional, é a primeira vez que essa matéria é disciplinada por lei. Mais tarde, alterada pelas leis nº. 8.883/94, 9.032/95 e 9.854/99, sendo também complementada pela Lei nº. 10.520/02, que instituiu a modalidade “Pregão”.
Sem dúvida, tal legislação é de grande importância, vez que seus princípios e regras geram efeitos em todas as esferas políticas e em todos os poderes do Estado Democrático de Direito. Todos os que operam recursos públicos, acabam por se submeter às regras da Lei de Licitações e Contratos Administrativos.
O grande desafio é aplicar essas normas de forma justa, de modo com que o administrador público possa, no bom uso do poder discricionário que lhe é conferido, alcançar a efetividade na busca pela proposta mais vantajosa, sem que as regras específicas de cada caso e, até mesmo a descrição do objeto licitado, possam estar dirigidas, deixando de gerar ao Estado e/ou ao particular um contrato garantido quanto a sua equação financeira.
A palavra “licitação” tem origem no latim, licitatione, acusativo do substantivo licitatio, que significa “venda por lances”. Em português, o vocábulo passou a ter o seguinte sentido “oferecimento de quantia, no ato de arrematação, adjudicação, hasta pública, ou partilha judicial”. Para o Direito licitação é, segundo Hely Lopes Meirelles, “o procedimento administrativo mediante o qual a Administração Pública seleciona a proposta mais vantajosa para um contrato de seu interesse”. Essa definição é uma das muitas encontradas na doutrina do Direito Administrativo, mas basicamente todas salientam o incisivo ponto sobre o qual está apoiado este procedimento administrativo: a vantagem para a Administração Pública.
Tal vantagem deve ser obtida oferecendo aos proponentes, iguais condições de participação e critérios objetivos de julgamento, respeitando-se em especial, os princípios da isonomia, da legalidade e da impessoalidade.
Para a obtenção da proposta mais vantajosa, permitindo aos licitantes concorrerem em iguais condições, o procedimento licitatório se desenvolve sobre princípios – normas genéricas acima das regras jurídicas. Em tese, as normas são definidas em função dos princípios, que direcionam e ditam os limites para a elaboração da norma e sua interpretação. Assim, na visão do Professor Miguel Reale (Lições preliminares de direito. 25. ed. p. 96 e 306), a norma ou regra jurídica apresenta um dever ser objetivo e obrigatório,mediante uma sanção, nos casos de regras de conduta. Já os princípios gerais de direito são “enunciações normativas de valor genérico, que condicionam e orientam a compreensão do ordenamento jurídico, quer para sua aplicação e integração, quer para a elaboração de novas normas” – principalmente os elencados no art.º 3 do referido diploma legal (Lei n.º 8.666/93): legalidade, impessoalidade, moralidade, igualdade, publicidade, probidade administrativa,vinculação ao instrumento convocatório e julgamento objetivo.
Estes, porém, não são os únicos, mas os básicos como lembra o Professor Diógenes Gasparini. Existem outros ainda, como por exemplo, os princípios da fiscalização da licitação pelos interessados ou qualquer cidadão, da competitividade, da padronização, da economicidade e do procedimento formal, espaços pela norma ou identificados pela doutrina. Esses princípios acompanharão todas as modalidades de licitação, objetivando sempre garantir a obtenção ao Estado, da proposta mais vantajosa, mediante iguais condições de competição.
De forma geral, podemos afirmar que o recurso é o instrumento hábil para provocar o reexame de uma decisão, buscado obter sua reforma ou modificação. Ademais, nasce da irresistível tendência humana de irresignação a uma decisão desfavorável, não se sujeitando a um único julgamento e da “possibilidade de erro ou má-fé do julgador” O direito constitucional de petição (art. 5º, inc. XXXIV da CF), aliado à publicidade dos atos administrativos (art.37 da CF) e o direito a ampla defesa e ao contraditório (art. 5º, inc. LV da CF), foi reproduzido também na Lei de Licitações e Contratos, que regulamentou os recursos administrativos através dos artigos 41 e 109.
O referido diploma legal, prevê alguns mecanismos para que os licitantes que se sentirem prejudicados pelas decisões no decorrer e ao fim do processo licitatório, possam recorrer levando as decisões questionadas para um reexame da Administração.
Em nome dos princípios da moralidade e da igualdade, a Administração Pública, como gestora dos interesses públicos, deve escolher a proposta ou oferta mais conveniente, permitindo um maior número de participantes e propiciando a todos acesso aos atos do procedimento licitatório.A conjugação da melhor oferta e do maior número de participantes é a tônica da atuação legítima do Poder Público quando da realização da licitação e celebração do contrato. O uso do poder discricionário conferido legitimamente à Administração Pública deve ater-se rigorosamente aos princípios da Licitação. A utilização desse poder de forma arbitrária traz prejuízos que podem ser vislumbrados em dois momentos, ou seja, quando da decisão pela aquisição de determinado objeto cuja necessidade não se faz presente ou, quando necessária a aquisição, sua descrição é feita com regras e características que poderão ser atendidas por somente um ou poucos fornecedores, rompendo com a isonomia e dirigindo a licitação.
O princípio constitucional da celeridade nos processos administrativos é visualizado mais facilmente nas modalidades “Convite” e “Pregão”. Ainda que a modalidade “Convite” contemple aquisições de menor valor, tal requisito não é observado na modalidade “Pregão”, que por sua vez utiliza-se de prazos que em nada contribuem para a isonomia, competitividade e ampla participação.
A inversão das fases quanto a análise das propostas e da documentação, e a possibilidade de lances verbais ou eletrônicos, indubitavelmente trazem economia a Administração, porém, o curto período de divulgação e a falta de regulamentação acerca dos meios de manifestação dos proponentes, configuram nitidamente, situações em que a celeridade se contrapõe à melhor contratação.
Data de publicação: 04/02/2007
por Flávio Roberto Balbino
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